Vivemos em uma sociedade onde praticamente tudo o que adquirimos vem emprestado por valores artificiais. Aos poucos deixamos de ser o que somos e passamos a nos identificar com aquilo que aprendemos pelo caminho. A maioria desses aprendizados é proveniente de instruções/sugestões comportamentais, nos regrando, nos condicionando e nos distanciando da nossa verdadeira essência do Ser.
Existem certos padrões não naturais que nos são impostos nesse processo.
Em todas as áreas, desde a fase da infância até a da velhice, somos pressionados a superar as expectativas depositadas em nós pela família, pela sociedade e automaticamente pela nossa própria mente.
É um processo inconsciente, invisível e que na maioria das vezes, começa já na infância. As notas na escola, a competitividade, o padrão de beleza, os diplomas, as posses, as conquistas, os troféus, a satisfação egóica e todo o tipo de ilusão ora são propulsores, ora ofertados como prêmio.
Fazemos parte desse jogo de forma automática. Desconectamo-nos de nós mesmos, lentamente e passamos a interpretar o papel de um personagem que, dirigido cada vez mais, por uma mente alimentada pelo inconsciente coletivo caótico, colabora com o processo de retroalimentação de uma sociedade doentia.
Nos tornamos vítimas e algozes de nós mesmos e, por fim, uns dos outros.
No meio dessa bagunça toda, um fator muito explorado é o da sexualidade. Esse tema é amplamente utilizado de forma desrespeitosa pela maioria dos setores da indústria desde o da alimentação, vestuário, fonográfico, cinematográfico e audiovisual como um todo. E isso resulta em uma grande interferência (leia-se manipulação) do nosso comportamento sexual, onde afetados pela debilidade de não termos a consciência e nem a percepção de quem nós realmente somos, não compreendemos então, a dimensão que implica a nossa sexualidade.
O templo que somos, se torna constantemente invadido por forças não harmoniosas e a grande força é desperdiçada sem propósito e nem serventia.
Alimento de obscuros e famintos, de desgarrados e de débil energia.
Contaminação, dissonância, desiquilíbrio, disritmia…
Não é por moralismo, conservadorismo, pecado, frigidez ou algo do gênero. Mas por compreender que a frase ‘não jogue pérolas aos porcos’ possuí uma abrangência universal.
Todos nós temos os nossos desejos, nossos anseios, nossas luxúrias, vigor e fetiches. De certa forma é natural e saudável. Mas uma grande parte disso, dessa avidez, dessa busca desenfreada, não provém do que somos, mas sim desse inconsciente coletivo ao qual estamos identificados e que é, entre tantas coisas, propositalmente sexualizado. Freud não estava de todo errado, existe muita frustração canalizada e direcionada para a exploração da sexualidade com a finalidade comercial e de alienação.
As pessoas passaram a interagir apenas com o corpo e desfrutam somente do prazer percebido pelo cérebro. Enquanto isso, toda a grandiosidade da experiência que deveria ser desfrutada por outra perspectiva, se torna reduzida ao fato em si e na maioria das vezes de forma individualizada. A intrínseca conexão pelos seres que se entre mesclam em suas singularidades, não é atingida e toda energia produzida no ato, é desperdiçada.
Retomar o poder sobre o corpo e o próprio desejo, faz parte da busca por autoconhecimento. É um caminho a ser percorrido por quem está começando a se perceber além do condicionado. Enxergar a beleza de uma interação mais sútil é transcender o prazer pelo efêmero prazer. O deleite e regozijo das penetrantes energias são somente tangíveis para aqueles que se tornaram verdadeiramente autênticos e quem alcança isso, se torna hábil para um estado de profundidade muito maior em quaisquer relações.
um pensamento qualquer, de Clarice Nunes